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quinta-feira, 2 de abril de 2009

ESTAMOS A PERDER AS PESSOAS MAIS CRIATIVAS (IV)

A Sorte favorece a mente preparada, como se costuma dizer. E as mentes mais preparadas são as que têm uma imensa curiosidade a propósito de um assunto específico

“Não sou um perito em educação, mas sabemos que os sistemas de educação tendem a alienar as pessoas que não são boas a fazer certas coisas e isso é considerado uma das funções do sistema, identificar as pessoas que não conseguem pensar da maneira certa (o que é uma maneira muito deselegante de pensar na criatividade).O sinal de que alguém é interessante e vai fazer alguma coisa significativa é alguém que é obsessivo, compulsivo (geralmente de uma forma saudável, mas nem sempre de uma forma saudável), alguém que faz uma coisa não porque lhe pedem, não porque é pago para fazer isso, mas porque está obcecado por isso, porque não pode deixar de o fazer. Aquela pessoa que tem de fazer música, que tem de tocar bateria, que aconteça o que acontecer tem de ser baterista. Que tem de desenhar, de inventar. Essa é uma característica de praticamente toda a gente que fez algo de significativo, todos tinham essa compulsão.

(…)

Eu falo das pessoas que acho que fizeram coisas muito interessantes e não andaram a dizer sempre a mesma coisa. Pessoas que perderam imenso tempo a estudar a sua actividade. Na publicidade podemos chegar a conhecer 300 ou 400 fotógrafos ao longo de um ano. Todos competentes, todos com uma formação de alto nível, etc. Mas só um deles vai fazer uma fotografia que vai mudar a maneira como nós pensamos, só um deles é capaz de nos mostrar algo que nunca vimos antes.

(…)

Há uma coisa interessante a propósito da sorte. Repare na história do tipo suíço que inventou o velcro, George de Mestral. A história é que um dia ele andava a passear no campo, umas bolinhas de umas plantas ficaram-lhe coladas às calças, ele viu que as bolinhas tinham uns ganchinhos e inventou o velcro e ficou rico e famoso. Isso é a história. Mas a verdade é que aos 12 anos ele já tinha patenteado o desenho de um avião. Era um inventor obsessivo. A sorte favorece a mente preparada, como se costuma dizer. E as mentes mais preparadas são as que têm uma imensa curiosidade a propósito de um assunto específico.

(…)

Muitas destas pessoas criativas perdem-se no sistema. Uma das razões por que as perdemos é porque não sabemos quais são os sinais que nos permitem identificar as pessoas criativas. Uma das razões por que eu escrevi o livro foi para dizer "vamos procurar estas pessoas e vamos ver o que conseguimos fazer com elas". Algumas podem ser completamente loucas, mas podemos arriscar. Neste momento estamos a perder as pessoas mais criativas. Devem estar a trabalhar no McDonald's ou coisa parecida. Estamos a perdê-las porque as nossas instituições e as nossas empresas não conseguem aceitar as pessoas mais inconformistas, as pessoas que resistem à autoridade.”


(continua)

Gordon Torr
In: «PÚBLICO» caderno P2
Sábado, 28 de Março 2009
Entrevista de Vítor Malheiros

Gordon Torr
Psicólogo; Consultor; Escritor
Autor do livro «Managing Creative People»
http://gordontorr.com/

1 comentário:

Nuno 'Azelpds' Almeida disse...

Tou a adorar ler este artigo aos poucos. :)

Curiosamente, uma das razões/defeitos que me apontaram num dos meus trabalhos anteriores, quando nos desentendemos de vez e tentavam arranjar argumentos é que, passo a citar, era uma pessoa demasiado criativa e tinham receio do que pudesse sair dessa mesma criatividade.

Na altura quando me disseram isto pensei apenas para mim se estariam a falar a sério tendo em conta que para muitos tal coisa seria algo de positivo, mas depressa percebi que sim, como tal virei costas e siga.

É um artigo pertinente, que dá que pensar para quem se identifica com as situações e não só.

No fundo, apesar de muitas empresas e trabalhos gostarem de dizer que gostam de pessoas criativas, que saibam pensar 'outside the box' e por aí adiante, a realidade é bem diferente, porque acabam por preferir precisamente é o contrário.